.por favor. por
favor. por favor. por favor. resista. esse ar que os seus pulmões não conseguem
manter sem estes artifícios da medicina. ele também não perdurará em mim se
você se for. sabe, toda essa gente que te matou um pouquinho durante a sua
jornada. por causa da sua orientação sexual. eles também não conseguirão respirar
nesse momento. não é privilégio de ninguém matar alguém aos poucos. muito menos
o não saber o porque o fez. ignorância é assim. floresce e esparrama rápido
demais. até secar todos os brotos, já pode ser o fim da vida. mas eles
sentirão. e te culparão. todo esse peso que não saberão nomear colocarão na sua
conta. e se salvarão em sua própria moral. e respirarão. mas você. você já não
poderá perdoar-lhes ou dar motivos para que o matem legitimamente. legitimamente.
mentira. isso nem existe. resista. resista para ser odiado. e odiar. resista para
ser julgado. resista para viver se esgueirando por estes becos que sempre te
obrigaram. resista para colorir seu armário por dentro, mas, por favor,
resista. não te peço a força para lutar contra eles agora. te peço o esforço de
inspirar. expirar. inspirar. expirar. por si. o mundo a gente ganha depois. por
favor. por favor. por favor. resista. porque ao partir, você vai me matar como
eles estão por fazer contigo. respiremos em re-existência.
das palavras que me adoecem como a febre e que depois de queimar-me, abandonam-me, restando apenas a cura.
domingo, 27 de dezembro de 2015
quarta-feira, 23 de dezembro de 2015
É por nós
.boas festas? e eu sou lá de bouas festas? eu sou de festas extraordinárias. não essa em que a felicidade é obrigatória em um dia. minha festa reside nos olhares sinceros. todos os dias em que os encontro. tenham fé nesse tal Jesus ou nem. eu sou de festas daqueles que entendem que se reunir não é por um ou outro. é por nós. na força da coletividade. não na força que nasceu uma vez, mas na que renasce todos os dias.
sexta-feira, 18 de dezembro de 2015
Crônica de uma não existência anunciada
.ontem eu desexisti uma poesia. deitada em quase morte-sono, ela girou a maçaneta do meu pensamento. o colchão se fazia lápide quente para o corpo. não quis alcançar caneta e papel. parada na porta entreaberta, ela silenciou o cansaço. avançou. disse ao que vinha. não a registrei. retirou-se. ao sair, desexistiu minha loucura-febre. e eu a desexisti.
quinta-feira, 10 de dezembro de 2015
Práxis
.toda vez que eu me pratico eu esbarro em alguém. nas projeções do corpo e no corpo em si. um ser que se projeta para o meu movimento-momento. para o bem e para mal. toda vez que eu me pratico eu me falseio. seja pelo aguilhão que não vejo, mas sinto até no fio da púbis. seja pela aprovação, que não requerida, me tira de mim. eu sou isso? eu sou. o que veem? sou o que vem. toda vez que eu me pratico sou inteira. para mim. sou totalidade totalizando o meu eu agora. e depois. e depois. e depois tropeço. porque o aguilhão desequilibra. felicidade demais pelo acerto. pesar demais quando julgada. executada. toda vez que me pratico. me pratico. aqui. agora. senão, só vem depois. toda vez. mas não é toda vez que me pratico. e me perco. e desapareço. aqui. agora.
domingo, 6 de dezembro de 2015
Hiato
.me encontraste antes, partindo-se. te encontrei enfim,
partido. colidimos, na verdade. porém, a força da repulsão nunca existiu, ou
venceu. seguimos em mosaico, mesma matéria dinâmica, cada vez mais um a
substância do outro. um espelho de gestos e olhares, um comum que suplanta o
comum, um individual que suplanta a individualidade. a energia desprendida
deste encontro prismou-se em cores diferentes. minha luz amarela. sua luz lilás. sou. somos. imanentes. somos
transcendentes. por isso, neste momento em que o hiato se impõe, não
necessariamente penso em partida. somos uma unicidade. a fratura apenas permite
que jorre mais de nós. o estar um no outro não pode repartir-se sem
multiplicar-se. por isso, não diremos aquelas palavras. a luz nunca se despede.
ela continua. e continua. e continua. é o preço que se paga quando o universo
nos oferece um presente como este encontro. o preço é ser este universo. na
permanente dúvida se ele está em expansão ou contração. satisfaz-me ambos. se
jamais nos encontrar-mos em outro ponto, arrastaremos o nós por todo o
percurso. se voltarmos ao ponto de colidirmos novamente, seremos nós em dobro.
porém, sempre contínuos. brilhantes. felizes por esta existência compartilhada
e única.
sábado, 5 de dezembro de 2015
Passageira
.posso e não posso descrever este lugar. suas ruas, paredes e gente concreta são uma cena que escapa de minha síntese. olho-os até cansar os olhos mas, eles ainda não decantaram em mim. não estou saturada desta realidade. o fato é: eu não estou aqui.
quarta-feira, 2 de dezembro de 2015
Cântaro
.sinto uma tristeza profunda. é tempo de choro. não, é tempo
de pranto. não se resume a uma lágrima que cai, mas um cântaro que se derrama
como se as águas nunca fossem acabar. eu pranteio. vejo o cassetete se erguer
no ar e entristeço até sentir os ossos amolecerem. um adolescente está no chão
com o pescoço refém de uma força que não é apenas policial. a escola é o mínimo
minimorum. a escola é recente na
história brasileira. esta força não. a escola, esta pública, muitas vezes, um
perfeito simulacro de navio negreiro onde nos depositam, nós, a maior parte da população negra, para
jogar-nos em um mercado que intenciona e procura reduzir-nos a menos ainda que
nossa força de trabalho. a escola, é o mínimo. mínimo. mínimo. mas a força, esta é máxima. violenta.
vergonhosa. e um corpo adolescente cai. e ele é, em uma porcentagem que se faz
com os olhos, quase sempre negro. e quando as lágrimas que escorrem me fazem
pensar na impotência que sinto, enxugo-as e encaro o adolescente ao chão. seu
corpo ali, impede que não seja a luta a refém. a luta. esta, travada por estes
que recebem a escola miníma. que disputa. que organiza. que enfrenta. com e por,
esta escola miníma que recebem. e não me envergonho pela tristeza que sinto.
ela é anterior. ela é por todos espaços em que não colocamos os pés, mas que
certamente o cassetete também estaria erguido. e ao manter o cântaro correndo
em mim, me sinto forte. por e com, o meu povo. com e por, estes estudantes. e
em esperança e força, pranteio negramente.
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